
Os Contos de Cantuária
Podemos começar a observar o Cavaleiro. Um homem muito digno, que, desde que principiara a montar, amava a Cavalaria, a lealdade e a honra, a cortesia e a generosidade. Valente nas guerras de seu suzerano, embrenhara-se mais do que ninguém pela Cristandade e pelas terras dos pagãos, sempre referenciado pelo seu valor.
Este digno Cavaleiro era prudente, e modesto na conduta como uma donzela. De fato, jamais em sua vida dirigiu palavras rudes a quem quer que fosse, perfeito e gentil. Quanto aos bens que ostentava, tinha excelentes cavalos, mas o traje era discreto: o gibão que vestia era de fustão.
O Cavaleiro também tinha consigo um Criado, e mais nenhum outro serviçal nessa ocasião, pois assim preferia cavalgar. Vestia este brial e um capuz de cor verde. Na mão trazia um arco possante e, à cinta, um feixe bem atado de flechas com plumas de pavão, luzentes e pontiagudas (cuidava bem de seu equipamento, não deixando setas soltas, caindo com as penas baixas). Co sua cabeça raspada e o rosto queimado de sol, era perito nas artes do caçador. Protegia o pulso com uma braçadeira colorida; pendiam-lhe do flanco uma espada e um broquel; e no outro lado se via belo punhal, de bom acabamento, aguçado como ponta de lança. No peito, uma medalha de São Cristóvão, de prata reluzente.
Temos que recordar que nem sempre pessoas que estão no meio de batalhas são bons na caça e na cortesia com o seu próximo, podemos citar aqui o Monge, que apesar de sua profissão era um excelente caçador. Este por sua vez mantinha soberbos cavalos; e, quando cavalgava, os guizos de seus arreios tilintavam claro e forte no sussurrar da brisa. O Monge
considerava antiquadas e algo rigorosas as regras de São Mauro ou de São Bento, esse Monge deixava de lado as velharias e seguia o modo de vida dos novos tempos. O Monge era apaixonado pela caça, logo podíamos observar os punhos de suas mangas orlavam-se de penas gris, as melhores peles desta terra; e que prendia o capuz sob o queixo com uma fivela de ouro artisticamente cinzelada, tendo na extremidade mais larga um nó cego, símbolo do amor.
Podemos dizer que tanto o Cavaleiro, como o Criado, como o Monge amam suas profissões, mas nem todos andam de acordo com que deveria, pois o Monge foge um pouco das regras que lhe foram dadas, por causa da sua paixão pela caça. Porém não podemos generalizar dizendo que todos ali presentes eram caçadores ou amantes da caça, podemos citar o estudante que era taciturno e dedicado aos estudos da filosofia.
Este Estudante já não se achava tão ligado ao mundo para exercer ofícios seculares. Preferia ter à cabeceira de sua cama vinte livros de Aristóteles e sua filosofia, encadernados em preto ou em vermelho, a possuir ricos mantos, ou rabecas, ou um alegre saltério. Este por sua vez, não dispunha da pedra filosofal, apesar de ser filósofo. Tudo que os amigos lhe emprestavam gastava em livros e aprendizagem, rezando constantemente pelas almas dos que contribuíam para a sua formação. Sempre taciturno, não não falava mais do que necessário, e sua fala, serena e ponderada, era breve e precisa e cheia de pensamento elevados, sempre voltados para a virtude moral. E aprendia com prazer, e com prazer ensinava.
Não podemos esquecer do local aonde tudo foi proporcionado, principalmente não podemos deixar de citar o Albergueiro, pois este recebeu festivamente a cada um de seus hospede. Acomodou seus hospedes para a ceia e servindo-lhes do melhor que tinha. O homem tinha jeito para mestre de cerimônias nos banquetes. Era corpulento e de olhar brilhante. Melhor burguês não havia em Cheapside: apesar de sempre dizer o que realmente pensava, procurava expressar-se com equilíbrio e tato. Ademais, estava sempre alegre. E, por isso, após a ceia, - e depois de termos acertado as nossas contas, - começou, entre outras coisas, a fazer brincadeiras e a planejar divertimentos como um verdadeiro anfitrião.
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